28 de jul. de 2012

Resoluções de meia-idade precoce

Oh Lord, I'm still not sure what I stand for 
What do I stand for? 
-Fun.


Há um quarto de século, eu estava experimentando o mundo pela primeira vez. Viver costumava ser seguro, sereno e com algum conforto. Até me deixei deslumbrar pelos contos de fadas que me enfiavam goela abaixo na infância [mas isso é pauta para outro assunto]. Eu era a café-com-leite num jogo amistoso, então não precisava me preocupar em ganhar ou perder, eu simplesmente não ganhava nem perdia. Eu, no meu canto, do meu jeito, era o centro do mundo até ele se virar contra mim. Tropecei, escorreguei, cai. Ainda acho que fui protegida demais.

Deram-me pouca noção das atrocidades que poderia encontrar pelo caminho, não me avisaram que eu estaria sempre rodeada por malícia e confusão, esqueceram de me informar que as relações são tão frágeis quanto papel e que tudo isso se acumula automaticamente no fundo do bolso.

Eu já tive todas as certezas a minha frente e depois as perdi, eu já tive muitas oportunidades jogadas como buquê, mas não compareci à festa. Eu tento não parecer ingrata, mas a minha fé leva ranhuras cada vez mais densas. Cadê o bonde que não vem? É para ficar aqui olhando toda a gente passar e ultrapassar? O meu tempo também tá passando, e aí?

Nunca pensei em seguir a pé, mas dar o primeiro passo é tudo o que me resta agora. Porque cansei de fugir da vida para me proteger, não quero mais fechar os olhos se meus sonhos estão lá fora esperando que eu levante e lute por eles. Às vezes, tudo o que se precisa é largar medos, apegos e encarar. Desistir não é mais opção. Eu sei que minha coragem está reclusa em algum cômodo da casa e já está na hora de arejar os espaços. Meta. Foco. Persistência. Não é assim que funciona?

Reconhecer a necessidade de se salvar sozinho é a última saída quando todas as outras se esgotam. Viver de autocomiseração, maldizer o universo e se fazer de vítima para tudo que dá errado é puramente escolher anular o escore, é preferir ficar no banco de reserva enquanto observa os outros jogadores fazerem história. Mesmo que eu me lance em mar aberto, decido me perder nas tempestades a ser mais um grão de areia consumida pela covardia. Acho que não importa o meio que defino para ir, contanto que eu siga.

Hoje, como um dia de cada vez, deixo a chuva nos meus olhos florescer o meu sorriso em gotas de esperança.


f.

6 de jun. de 2012

Sinto, logo escrevo



Não há segredo, teoria, fórmula ou equação. É uma expressão, uma vontade, um ato. Em palavras despisto minha loucura e esboço novos sonhos. Encontro uma parte de mim que só se mostra no papel; expulso, em doses, sentimentos que só se moldam às linhas retas e tortas de qualquer superfície que convenha ao propósito de experimentar e compartilhar vida. Arranjo letras em simetrias nem sempre coerentes e elas me movem a rumos distantes para provarem que eu tenho de passar por tudo isso. Eu conto partidas, conto saudades, conto amores e conto encontros. É um prazer desinteressado de quem nas entrelinhas revela esconderijos e dissimula o óbvio. Escrevo para descobrir modos de me resolver sem abreviar minhas chances. Alargo o mundo em milhares de idéias e deixo registrado em tinta todas as histórias que cruzam a minha própria. São escolhas que precisam ser escritas, não ditas.

f.

"Se a  tua dor te aflige, faz dela um poema".- Eça de Queiroz

1 de jun. de 2012

Eu espero


Eu ia dizer que te amei muito, aí lembrei que o verbo no pretérito é somente a mentira na qual eu me forço a acreditar. Hoje, a gente só divide a distância, mas já houve época em que o céu não cobria tanta afeição. Queria ter notado depressa quando o recíproco virou platônico, assim evitaria uma porção de pedidos jogados ao alto para você me querer um pouco além de mãos dadas e beijo na testa. 
Presto atenção em qualquer carro que passe pra ver se você está dentro, parece que ainda espero por uma carona no banco da frente. Não tem jeito, esperar é só o que me resta. Você não imagina o quanto esta cidade é triste. Ela não tem você, assim como eu, assim como nuvens baixas; aprendemos a chorar todos os dias. 
Aqui só existe uma ausência cheia de perfume seu. Falta a solidez para proteger meus delírios, a inclinação pra transformar tudo em mágica. Já peguei o telefone incontáveis vezes no impulso de te perguntar se você ainda topa, se ainda está disposto a me acompanhar naquela fantasia louca de querer ir à guerra ser correspondente, mesmo que meus pés estejam bem fincados nessas ruas calmas e a única guerra que amargo venha de dentro de mim. 
Pensei, então, em voltar aí pra te narrar a historinha da menina que se apaixona pelo melhor amigo e foge porque tem medo da rejeição, mas sou vencida por esse medo da mesma forma que sempre te escrevo essas cartas e as guardo dentro do peito. Tanta gente amando mais, se doando mais, e fazer parte da estatística não é opção. 
Não podia suportar outro minuto te ouvindo falar sobre a garota por quem você atravessaria o país para encontrar. Era tão difícil assim olhar pro lado e perceber que você não precisava nem dar meio passo pra achar alguém que cruzaria googols de terras por você? Não acho certo ter tanta vergonha de sentir, é tão insano, um amor tão bonito não devia precisar de disfarce, mas não tenho certeza que se eu disser você vai querer também. 
Prefiro não pensar que seu futuro não combina comigo. Renunciei aos milkshakes, ao banco da praça e ao seu abraço quente de apenas amigo; afastei-me para ver se você tem vontade de juntar a gente com algo mais forte que cola Super Bonder e nó de marinheiro. Preciso da sua vontade de ficar comigo. Do contrário, vou continuar acordando todos os dias morrendo de falta sua, tentando manter o sentido nessa espera e confiando, sei lá até quando, que o destino irá atrair o tempo certo pra nós dois, porque eu não sei dizer adeus.

f.

3 de mai. de 2012

A você que escolheu ser mais um


- -
Eu poderia te jogar na cara todas as lágrimas que juntei em baldes só para medir o tamanho da sua indiferença. Eu poderia fazer uma exposição detalhada de todos os dramas montados para denunciar os tipos de vilão que você interpretou. Eu queria te arrastar até a cena dos crimes que você cometeu só para te mostrar quantas esperanças você matou em mim. E eu poderia me tatuar com uma amargura infindável para não esquecer o meu ódio e toda a mágoa que tomou o seu lugar.
Você usou uma lábia pronta para amortecer minha insegurança e conquistar territórios. Fantasiou-se com romantismo e me fez pensar que era o homem perfeito para qualquer mulher. Uma amarração frágil, uma carência mal entendida e lá estava eu sentindo tudo que não devia por você. Mas, você soltou minha mão no meio de um labirinto, e o que a gente tende a experimentar quando alguém nos abandona é o amor que fica não o que vai embora. A aspiração nessa hora é automaticamente esmagar os bons momentos com decepção e raiva.
Eu não fui exceção. Eu não ganhei o artigo definido antes da pessoa, da mulher, do sentimento. Tampouco reinei ao seu lado enquanto acreditava estar com a coroa na cabeça. Demorou até eu compreender toda sua sinceridade fingida e demorou até me por no meu devido lugar na lista de prioridades. Eis o porquê de te escrever essas linhas. Finalmente, posso ser franca sem a interferência de qualquer ressentimento que me reduza à mediocridade.
Admito que fui condescendente com as suas teorias sobre tudo,  escancarei portas, janelas e portões, eu deixei, eu quis, eu fui cúmplice e sem o seu incentivo eu não teria chegado tão longe. É por isso que me faço em palavras, preciso te dar o reconhecimento por ter me preparado para o mundo. Pessoas são feitas de marcas e você me cravou algumas que converti em meu benefício. Agora eu sei que cicatrizes são uma espécie de armadura que nos tornam menos relapsos. 
Obrigada por tantas vezes ter sido meu estímulo para levantar da cama e enfrentar meus pequenos monstros. Depois que o efeito passou, eu simplesmente deixei de ser menos para ser nada menos que o meu melhor. Mas você me ajudou a crescer, a andar sem muletas sentimentalistas, a rever parâmetros e priorizar urgências. Eu estou enxergando o mundo com outras lentes agora e o coração palpita livre dos restos ruins.
Não te culpo mais pelas minhas tragédias pessoais, infernos e melodramas. E isso me faz um bem sem precedentes. Deixar você ir foi como defenestrar um tanto de tralha imenso cujo prazo de validade havia expirado. Voltei a me deparar com tipos iguais ao seu e me orgulho de levar na bagagem a sua lição.  Antes que você questione, é de experiência que estou falando, garoto. Você me impulsionou a subir os degraus, pode se orgulhar! Você valeu a pena porque despertou em mim a necessidade de me fazer feliz acima de tudo.

f.

27 de abr. de 2012

Do tempo que a gente era



Estava dando uma geral na minha estante [coisa que não fazia há um bom tempo] e te encontrei lá na prateleira de DVDs. Entre filmes europeus e asiáticos e grandes diretores americanos me dei conta de que já não nos falamos há meses. Vê se pode? Meses! Logo nós que costumávamos nos falar diariamente. Daí eu tentei voltar aos fatos; se por descuido ou qualquer outra desculpa feita na hora a gente se afastou sem pestanejar. Não encontrei nada que valesse o período ausente, mas o tempo tem mesmo essa mania de correr enquanto se está distraído, não é!
Esquivei-me mil vezes de escrever esta carta sem a certeza de que ainda tenho o direito. Da última vez que eu tentei contato, meio apressada, você foi um tanto evasivo e seco e eu fiquei imaginando se não passou de uma resposta também apressada ou uma sugestão para eu não te incomodar mais. O que quer que esteja se passando, eu gostaria de entender os seus motivos e explicar qualquer coisa que você queira saber.
Eu sei que nem todos os meus textos foram sobre você, nem todas as poesias rimaram com o seu nome, mas você nunca deixou de ser importante. Você foi meu único amigo quando todos os outros sumiram e até aceitou minhas esquisitices, mesmo reclamando, você me aceitou.
Traz uma saudade histérica lembrar as horas sem fim de conversa fiada no meio da madrugada. Você me tirando do sério, do sono, da solidão. Você me fazendo rir. Você brigando comigo. Você cantando desafinado. Sua empolgação ao falar de filmes. Você me fazendo rir. Você me obrigando a ver vídeos do Youtube. Você falando sobre futebol [tédio]. Você me explicando como é a sua mulher ideal. Você me cantando. Você me fazendo rir, até esquecermos a lonjura, os problemas, o resto.
Eu tô é achando chato esse jeito de levar a vida sem ter pra quem contar os caprichos. Você também não sente falta de nada, nadinha, nadica de nada? Tirando a aposta que fizemos em nós mesmos, não sobra nem a amizade? Você simplesmente cansou? Embora seja óbvio que nenhum dos dois espere mais pelo outro, não cabe em você carinho e disposição para cultivar o que ficou em comum além do desejo? Eu realmente me recuso a crer na efemeridade dos nossos planos, porque me faz falta as suas expressões esdrúxulas e até sua mania estúpida de superioridade. O certo é que você sempre se preocupou comigo e sempre fez questão de dividir todos os seus dias.
Assumo parte da culpa, assumo também minha súbita e breve necessidade de me distrair em outros diálogos. Mas tô aqui sem máscara, sem meandros, sem a TPM que te assombrava de vez em quando, pra pedir pra você voltar pra minha vida, seja a conta-gotas ou como enxurrada. Que você volte e volte a disputar comigo quem tem o melhor gosto para filmes e séries e música e quem é o mais esperto dos dois. Tanto tempo sem as suas brincadeiras ácidas, sem seus comentários maldosos e eu nunca pensei que fosse querer ouvi-los outra vez. Você não combina com silêncio.
Só para constar, eu me formei, cortei o cabelo, me apaixonei, me desapaixonei, saí do Estado, pensei em fugir com o circo, mudei de idéia, tô fazendo pós agora e tô querendo notícias suas. Em nome dos velhos tempos, me conta ao menos se seu sorriso tem visitado seus lábios com frequencia, se os seus sonhos estão se realizando direitinho e se você parou de jogar tanto vídeo game. Aí eu paro, paro de te perturbar, de agir como intrusa quando o que você quer é apenas ficar quieto.  Só preciso saber que você tá levando, que tá sendo forte sem mim e que eu não careço mais desse coma induzido para não lembrar o quão longe você continua.

f.

25 de abr. de 2012

Quem sou eu?



De todas as dúvidas elementares não me alcança a proeza de me definir. Sou jovem de mais para alegar que já vi de tudo nessa vida. Volúvel de mais para querer me fixar em um só lugar. Mas antes de você eu tinha algumas certezas que agora desabaram. Será que mais uma vez fui ingênua a ponto de me deixar guiar pelas suas mãos inconseqüentes? Eu não quero abarcar suposições frívolas quando posso te largar em uma tomada de decisão. Mas entenda que o difícil se prende exatamente nesse ponto: sempre que resolvo desatar o laço entre a gente, eu me deparo com um nó cego. E não fui educada para ficar em cima do muro. No entanto, é exatamente assim que eu me sinto. Desliguei-me de alguns princípios, hábitos e amigos para te fazer o centro do mundo. Sufoquei minha consciência, minha intuição em troca de me permitir ser um algo a mais na sua rotina. Hoje, não me reconheço nos meus próprios traços. Não me acho, não me distingo. Sou uma crise de identidade que perambula entre uma dimensão e outra sem encontrar o caminho de volta, mas querendo, e tentando. Estou cheia de sentimentos intempestivos, esperanças moribundas e faço meus passos sem regra nenhuma. Meu sistema está quebrado e de longe percebo que não dá para continuar assimilando as mesmas razões como se ainda fossem minhas. Me perdi e me perco cada vez mais em um roteiro alheio; estacionada numa história de improviso, rodeio vezes sem fim quem sou, quem me tornei. E o que me mata é que antes eu tinha algumas suspeitas, hoje não me sobram nem cinzas.

f.

11 de abr. de 2012

Ciclos



Assumo minha incapacidade de correr adiante sem intensidade. Eu sou corpo, mas acima disso me preencho na alma. E por ser alma me alimento de sensações. Portanto, sem o devido estímulo o coração está apto a perder o alento com facilidade. É como as peças de um quebra-cabeça que simplesmente não se encaixam senão em seus próprios espaços. É como certas verdades que pelo caráter ferem, pelo desígnio destroçam. E não adianta recorrer a mentiras. Elas não curam, não aliviam, nem mudam os fatos.

Algumas coisas não fazem sentido, acho pior quando outras perdem o significado, porque é frustrante chegar até metade de uma jornada sem entusiasmo e convicção. Daí as exceções viram regras, os paradoxos se encerram e o vigor se contrai para o novo. Algumas pessoas são de insistir, no entanto, há quem desista e pronto. Mas desistir não é sinônimo de perder. Desistir também envolve abdicar do par de sapatos favorito por não caber mais em seus pés. É simples, porém exige algum desapego.

As expectativas estão sujeitas a minguarem até o ponto de se tornarem um elemento neutro na equação. Em casos menos extremos, o processo se manifesta de tal forma que, como brincadeira de criança, você só precisa de um intervalo para respirar e voltar a correr. Daí a idéia de “dar um tempo”. Serve para recuperar energias, redefinir prioridades, examinar escolhas e tecer novas estratégias. Só não aconselho usar o padrão em relacionamentos. Geralmente os efeitos são escassos e é inútil marcar no calendário um feriado que cai no domingo.

Das fases que nos lançam ao movimento, tem sempre aquelas que se alternam em períodos, as que se tornam pontos reticentes e outras que se aniquilam no fim. Funciona mais ou menos como a vírgula, as reticências e o ponto final em um texto. Soa medíocre se obrigar a qualquer tipo de atividade mecânica a qual não inspira nenhum tipo de satisfação e atrasa em todas as nuances as aspirações para quais jogamos nossas perspectivas. É preciso juntar a oportunidade com a vontade de fazer. Não é papel de ninguém agir feito marionete e é tentando soltar os fios que se chega a algum lugar. Mesmo que se leve uma vida inteira para encontrá-lo.

f.

25 de mar. de 2012

Super-homem



[...]

-Amar é meio parecido com ser um super-homem, porque você rasga o peito e abre o coração para que a pessoa possa morar ali incondicionalmente. Ela passa a ser a humanidade que você deseja acalentar e seu sorriso se torna o melhor pretexto para você subir até sua janela todas as noites. Aliás, você poderia voar o mundo se quisesse, mas troca qualquer maravilha só para estar perto de quem você pertence, mesmo que do outro lado do vidro. E você usa sua super força para tirar de órbita tudo o que pese na alegria dessa pessoa. Enfrenta qualquer perigo para tê-la segura e sua capa persiste em, um dia, servir de abrigo onde ela possa descansar. Você lamenta se ela escolhe outro herói, apesar disso, se regenera diante de sua felicidade e ainda assim entrega sua própria vida para poupar lágrimas no rosto dela. Você se reconhece nos olhos da pessoa, pois ali estão contidos todos os segredos do universo. Eles são a sua kryptonita, te deixam vulnerável, mas você não se importa de sangrar de vez em quando. Você tem os seus sonhos todos os dias ao seu lado e eles parecem não perceber que deveriam se tornar reais, no entanto, você não tem pressa, já que sonhos precisam ser conquistados. Você quer ser notado sim, pelo seu lado humano, não por super poderes.  

-Huum, então é por isso que os heróis não revelam sua identidade, porque os verdadeiros heróis não procuram recompensas para o que fazem de graça.

-Isso. Pena que nem todos são de aço para entender.


f.

21 de mar. de 2012

Mais do mesmo, você


Sinto-me enclausurada em versos intimistas, que de tanto se voltarem para o mesmo assunto já cansaram as próprias palavras. O ineditismo não cabe mais nas minhas intenções de desabafo. Vivo predestinada a qualquer coisa que não passe do prólogo, mesmo assim, sem qualquer vestígio de êxito, tento imprimir em páginas silenciosas uma continuação otimista aos meus anseios. E não adianta fingir que estudo, me acolher em filmes que me incitem o riso, me cercar de gente estimada. Aos pontos de vista lógicos não restam nem os efeitos e não importa quantas milhas nos afastem, cada terminação nervosa do meu corpo se ramifica até você de uma maneira ou de outra. Arrisco conjecturas no intuito de assimilar sua parte da história, mas sou constantemente traída pela minha lucidez. Já não me encontro como espectadora desta ode, embora carregue em mim resquícios de um antigo estado sóbrio. Tenho a vida atrasada, o coração apunhalado e o sono castigado. De tantas suposições, a única que não alcanço é o que ficou de mim em você. Seria idiota pensar somente no que eu sinto, então imagino milhares de acasos, destinos e coincidências só para antecipar o que você me diria enfim. Só para compreender que as linhas que eu entôo não passam de um monólogo. Reviro-me nessa busca sem respostas, nesse lançamento sem alvo a que uma espera cega induz. Já passa da hora de tirar da playlist todas as canções com o seu sotaque. Aguardo a disposição me direcionar os atalhos e a coerência recuperar o fôlego de vez, pois esperar as providências do tempo é talvez a única forma sensata de levar você comigo. Sem precipitar o relógio, sem equivocar medidas. E entendo que é necessário escrever muito sobre você para que, aos poucos, cada pedaço exposto deixe pelo caminho uma trilha que não precise mais ser visitada. Assim não me nego, assim não me anulo. Assim os capítulos fluem sem apelos ou encargos. Mas por enquanto, isso: mais do mesmo, você.

f.

17 de mar. de 2012

Aos intrusos


Não venha me falar quem eu devo ser, não ouse ditar meus modos como uma mãe educando um filho, não sou sua filha, nem chego a ter algum parentesco com você. Então, não confunda sinceridade com intromissão. Não queira desordenar meu ecossistema, isso já é cruzar a linha do bom senso. Onde foi parar o respeito? Não diga que eu deveria ser mais simpática ou espontânea, não recrimine minha quase misantropia, não fale mal do meu gosto por filmes europeus e asiáticos, nem me olhe torto pelo casamento não estar entre as minhas prioridades. Eu não preciso retornar as suas ligações, ou empregar alguma reciprocidade nesse relacionamento. Somos dois desconhecidos, nada mais, e você já pensa em me afastar da minha natureza! Então deixa eu te alertar: não me ajusto a condicionamentos fabricados por serpentes ávidas em forçar seus interesses sob ameaça de seu veneno. Ou simplesmente não me ajusto a qualquer condicionamento fabricado, a não ser por mim. Eu sou a essência que me conduz e não admito que ninguém se atreva a conduzir minha essência. E isso não é intransigência, apenas uso minha condição de ser livre a meu favor. Não me apetece ser mais uma amostra grátis no mercado, sou uma tecnologia avançada para o que te cabe, edição Deluxe. Não sou para todos, nem para qualquer um. Fujo de relações forçadas, amizades forçadas. Portanto, não tente podar meu livre arbítrio, porque eu vou me afastar. Não tente me enquadrar em resoluções sociais falidas, porque eu vou me afastar. Não haja como se soubesse o que é melhor para mim, porque eu vou me afastar. Esse tipo de solidariedade eu dispenso. Quero não, obrigada! Eu gosto de pensar por mim, faço questão de usufruir até a última gota de liberdade que me pertence e não adianta me pressionar a sentir o que não sinto. Entende? Não? Tanto faz, porque não estou pedindo sua aprovação.

f.

16 de mar. de 2012

Saga de vidro


A moça vive de erguer universos, disseminar utopias e compor diversas personalidades. Sua coragem antepassa o infinito e é mais densa que o peso de papel que esmaga seu sonho. Sustenta coreografias em intenções puras, desnorteando tropeços, ziguezagueando entre tons elevados e moderados. Engatilha-se de virtudes e se arma com encanto e poesia para enfrentar desde os redemoinhos até os furacões mais intensos. Adapta-se às estações e muda de cores conforme a direção do vento. Entrega-se ao que é natural e sabe que bolhas de sabão podem conter sonhos perdidos. Ela já pintou grandes cenas de seu próprio enredo e algumas até guardam borrões indecorosos, mas é só uma expressão do equilíbrio das colorações. A moça se veste de emoções o tempo inteiro porque sentir de verdade é mais sábio que ter um espaço preenchido pelo vazio. Assim a vida segue inteira. E a alma atinge desperta a parada seguinte.

f.

15 de mar. de 2012

Condicional


Mire as estrelas e acerte meu coração.
Decore cada gesto do meu sorriso.
Se esforce para ser o homem da minha vida.
Me vicie em você, até em seus defeitos.
Busque meu carinho sempre que lhe falharem as palavras,
mas não faça disso um artifício para me enganar.
Seja minha rotina de todas as manhãs.
Dê-me a chave dos seus segredos, o baú com seus sonhos.
Não me ofereça o guarda-chuva,
mas seja o meu abrigo nas horas de tempestade.
E me desenhe janelas ensolaradas.
Sucumba todo o caos e me furte até o conto de fadas mais próximo.
Deseje ser salvo só pelo meu abraço.
Atravesse o oceano pela minha afeição.
Tire tudo o que doer do dicionário.
Contemple os anos antes de nós
e compreenda a felicidade que você só conheceu depois.
Passeie na minha vida como quem veio para ficar. E fique.
E assegure que pelas próximas vidas seremos você e eu. 
Juntos e acontecendo.

f.

7 de mar. de 2012

Desrime, viva


Algumas vezes somos obrigados a escrever sem rimas, e às vezes não vale a pena nem tentar reescrever; às vezes a desarmonia soa mais bonita que a mais bonita das consonâncias. Isso porque versos rimados são pensados, articulados, mensurados para combinarem e parecerem perfeitos. Tudo o que não rima carrega a leveza das possibilidades, a liberdade para se chegar mais longe, a intensidade de uma segunda chance, e sua grandeza está no sentido do que se pretende cantar ao mundo, não em limitadas terminações gramaticais.

f.

5 de mar. de 2012

Do jeito que ficaste



Lembras o nosso encontro? O nosso primeiro? Estava eu, toda distraída, tentando dissimular o fato de estar desacompanhada, arriscando uma pose de mulher bem resolvida. E antes do espetáculo começar, nossos olhares se atingiram e se detiveram um no outro. Uma curiosidade aérea de saber quem eras e de onde vinhas pairou em meu instinto, ainda que frouxa, ainda que tímida. E tu, com ar acanhado, passavas por mim na desconfiança séria de te observarem. Ao fim, te aproximaste com uma proposta irrecusável - finalmente, decifraríamos nossos olhares, sem opções extras.
Teu olhar ficou. O momento ficou.
Tu não.

Não havia pretensão de me deixar cativar. Distanciar-me de minhas metas era um caminho extremo a seguir. A relutância me acompanhava os atos sempre medindo à exaustão minhas escolhas. No entanto, estavas mesmo disposto a conquistar-me e eu nunca completamente alheia aos teus esforços. Preparaste-me canções que diziam sobre nós todas as rimas inversas de dias passados. Embalamos nossas esperanças na dança que executamos sem ensaiar passos. Inspiraste-me vida nova, amor.
As canções ficaram. O romance ficou.
Tu não.

Sempre sonhei com um dia assim, em que, me desprendendo da mesmice, me entregando aos fatos, me satisfaria sem amarras na espontaneidade de voar o mais alto dos vôos. Confessaste-me lindos poemas em pleno ar, que diziam sobre ti o tanto de uma vida na qual gostaria eu de me vazar. E cada estrofe soou ecos pelo infinito, anunciando que já não era razoável jogar fora um carinho tão grande, que só cabia em nós e era só teu.
As confissões ficaram. Os sonhos ficaram.
Tu não.

Tivemos os mundos apartados e aos poucos aprendi a te ter por perto, mesmo que só dentro do coração. A vontade era mesmo a de te repetir por todo o resto da vida. Sabe-se lá o que pensa Deus para unir e depois separar, mas não cabe a mim, nem a ti julgar as circunstâncias. O nosso tempo não estava errado, errado estava o tempo dessincronizado. Porque, afinal, o que era assunto sério para ti, era diversão para mim; fazias parte do show, eu da platéia; tudo que precisávamos era nos encontrar.
Teu nome ficou. A ausência ficou.
Tu não,
mas quem sabe um dia voltes.

f.


Inspirou-me:
Hoje eu ouço as canções que você fez pra mim
Não sei por que razão tudo mudou assim
Ficaram as canções e você não ficou
Esqueceu de tanta coisa que um dia me falou
Tanta coisa que somente entre nós dois ficou
Eu acho que você já nem se lembra mais
As canções que você fez pra mim – Roberto Carlos

2 de mar. de 2012

Carta de amor de um homem notável



Bom dia, em 7 de julho

Mesmo antes que eu me levante, meus pensamentos se dirigem a ti, minha Amada Imortal, às vezes com alegria, às vezes com tristeza, à espera de que o destino nos escute. Só posso viver totalmente contigo ou não viver. Decidi errar por lugares distantes até poder voar para teus braços e me sentir em casa contigo e poder enviar minha alma cercada de ti para o reino dos espíritos. Sim, lamento, deve ser assim. Irás superá-lo com mais facilidade sabendo da minha fidelidade a ti; outra jamais poderá se apossar de meu coração, jamais! Oh, Deus! Por que precisamos estar separados daquilo que amamos? E, no entanto, a vida que estou levando em W. é miserável. Teu amor fez de mim o mais feliz dos homens, e o mais infeliz. Na minha idade é preciso ter alguma continuidade, uma vida estável. Será que isso é possível numa situação como a nossa? Meu anjo, acabo de saber que a correspondência é remetida diariamente, portanto, preciso encerrar para que possas receber esta carta imediatamente. Fica tranqüila, ama-me hoje e ontem.
Em lágrimas, anseio por ti, minha vida, meu tudo, adeus. Oh! Não deixes de me amar e jamais duvides do coração mais fiel.

Do teu amado,
L.

Para sempre vosso
Para sempre minha
Para sempre nosso



Trecho retirado do livro Cartas de amor de homens notáveis [Love letters of great men, 2008], organizado por Ursula Doyle. Capítulo dedicado a cartas de Ludwig van Beethoven a sua Amada Imortal, pág. 69.

1 de mar. de 2012

O maior desejo do mundo



Queria que você existisse 
do lado de cá, 
assim como existe 
do lado de dentro.

f.

27 de fev. de 2012

Promessas não cumpridas


- Quando é seu aniversário?
- Eu já te falei.
- Mas fala de novo!
- Para você esquecer?
- Para eu lembrar.

(...)

Para muitos, só um dia normal. Mais um. E ainda acho que eu deveria pensar como a maioria. Mas amanheci diferente, meio esperançosa de algo. Na verdade, estou atolada de trabalho, a casa clama por uma arrumação e parece que tenho cada vez menos tempo para mim, para tudo. Mas, não, não. Não é tão grave assim. Hoje eu tô um tanto mais exagerada também. Me preenche essa sensação auspiciosa, ainda que o momento seja tudo, menos perfeito. Aliás, eu nem deveria estar reclamando. E não estou, juro. Eu tenho casa, trabalho e... família, amigos, livros, viagens, histórias legais para contar. Me encontro aqui em frente ao computador, tentando finalizar esse projeto que já deu tanta dor de cabeça. Curioso como as idéias nunca aparecem antes da maldita dor de cabeça. Mas veja você, nos últimos meses tenho sido invadida por conceitos demasiados românticos. O que eu dispenso em assuntos profissionais. E eu sei que isso advém de uma expectativa imensa pelo dia de hoje.


- O problema não é o aniversário. O problema é se você vai se lembrar de mim.
- Por que você diz isso?
- Você acha que nós estaremos juntos até lá?

(...)

Essa inquietação boba foi o dezembro incrível que me marcou. Ainda bem que sou resistente. No exercício da rotina, eu ainda consigo encontrar uma paz branda que me move adiante. E o pessoal fez questão de me levar para comemorar depois do batente. Meus amigos compõem boa parte dessa minha força. Bem agora estou rodeada de serezinhos confiáveis e loucos. São poucos, porém preciosos. Eles nem imaginam que a minha mente está em algum lugar onde a primavera sorri. Mas é inevitável pensar naquele rapaz. E se ele soubesse que eu continuo usando aquele sabonete só porque ele gostou do perfume, e que eu experimentei aquele corte mais reto só porque ele dizia que combinaria comigo? E se ele soubesse que eu continuei esperando?


- Não sei. Eu só quero que você sinta que é importante.
- E sou?

(...)

Sim. Eu sou feliz. Não duvide disso. Não veja mal humor ou vestígios de depressão aqui. Só queria algo que o trouxesse para perto. Que fizesse essa saudade fazer sentido, pois de nada adianta sentir falta se não estiver disposto a exaurir o afastamento. E dessa vez não serei eu a abrir mão, mesmo querendo me sentir importante para ele. Como ele prometeu. Então, essa é a 46871313168468ª vez que olho para o celular por uma mensagem que não chega, uma chamada que não me congela até os ossos. E me vejo agora na cena célebre do filme 500 Dias Com Ela, quando a expectativa não corresponde à realidade. Mas continuo com o whisky na mão, sorriso torto no olhar e ele no pensamento. Tudo ao redor é como tem de ser. E essa espera, no final, é só vontade. O telefone não tocou e eu já nem me lembro como a conversa termina.

f.

25 de fev. de 2012

Meu adeus ao Gabriel



Quando eu conheci o Gabriel, ele estava em outra e eu também. Mas éramos colegas de classe, então passamos a nos ver todos os dias. O Gabriel sempre chamou a atenção com o seu estilo despojado e um humor inteligente. Ele parecia falar com todo mundo, menos comigo.

Um dia eu estava na biblioteca com umas amigas pesquisando para um trabalho em grupo e o Gabriel apareceu. Ele ficou com sua equipe numa mesa próxima, e ao final das atividades a gente já tinha se juntado pra bagunçar baixinho. O Gabriel sentou ao meu lado. E nós conversamos pela primeira vez. Isso não mudou muita coisa entre nós. Agora a gente se cruzava nos corredores e se cumprimentava. A essa altura eu já estava na do Gabriel, mesmo que ele ainda estivesse em outra.

Semanas depois, nos encontramos em uma festa. Falamos-nos brevemente e depois disso não o vi mais. No dia seguinte, me disseram que ele passou um bom tempo me procurando na festa. Meu estômago começou a soltar fogos de artifício.

Arquitetei um plano para me encontrar com o Gabriel sem que ele soubesse do meu interesse. O plano deu certo e fomos ao cinema. Foi lá então o nosso primeiro beijo. O beijo mais doce que eu já recebera. A partir daí, não nos desgrudamos mais.

No 12 de junho, o Gabriel me pediu em namoro. E eu soltei um não bem no meio da cara dele. O Gabriel queria namorar e eu não sabia o que queria. Ele pagou a conta e pediu um táxi para mim. Voltei para casa chorando e sozinha, mas pro Gabriel foi pior. No dia seguinte, conversamos sobre o ocorrido e concordamos em não rotular a nossa relação. Com o passar do tempo, eu percebi o quanto o Gabriel era especial. E logo desejei ser a sua namorada. O segundo pedido de namoro foi feito por mim.

O Gabriel me olhou sem entender e começou a rir da minha cara. Nós estávamos oficialmente namorando. Ele cuidava de mim e me fazia crer em todas as bobagens piegas dos namorados. Nós saíamos pelas ruas sem destino, trocando pedaços das nossas vidas e sendo felizes por estarmos juntos. No meu aniversário, o Gabriel me mandou flores e me levou para jantar. Ele conquistou o apreço do meu pai e virou o novo filho da minha mãe. E eu comecei a achar que não podia mais viver sem o Gabriel.

Nós vivemos sonhos por um bom tempo. Até que o Gabriel mudou de personalidade. Ele não quis conversar, nem me explicar o que estava acontecendo. E eu tive que ser paciente e dar espaço para ele. No final, o Gabriel não queria mesmo continuar comigo, e nos separamos. Entrei em estado letárgico. E quem costumava afirmar com convicção, no início, que não combinávamos, se surpreendeu ao saber que não éramos mais casal.

Passei pelas mais melosas canções de amor até chegar à página do Gabriel na internet. Ele dizia estar à procura de alguém para amar. Esse alguém não era eu. Em uma segunda visita, o Gabriel já havia encontrado. Então, tudo fez sentido. Ele me enganara, havia olhado nos meus olhos e mentido sobre suas razões.

O pior era ter que conviver com o Gabriel, por causa das aulas. Eu passei então a ser torturada diariamente. O Gabriel havia se tornado o meu melhor amigo, o meu melhor namorado, e agora nós agíamos como dois estranhos. O pior de ter o Gabriel foi ter que perdê-lo depois. E com todas as coisas que ele me fez, eu ainda gostava dele.

Passei um tempo amando e odiando o Gabriel simultaneamente. Aprendi um monte de coisa que ele nem imagina que me ensinou. O Gabriel me deixou vulnerável por um tempo, mas tudo que ele causou me fez forte. Eu descobri pessoas que se importam comigo de verdade. Aprendi a sorrir em plena guerra e a sair vitoriosa. Passei a exercitar a cautela para não mergulhar de cabeça no chão. E entendi mais sobre a dialética de liberdade e sobre a vida. O Gabriel foi um grande professor e quando percebi isso passei a lembrar dele, não por sua traição e desonestidade, mas por gostar de poesia e não sentir a necessidade de rir quando os outros riam.

Hoje o Gabriel me apareceu de dentro de uma gaveta, selado em uma caixa que eu nem tinha lembrança de ter mantido. Eu rasguei o Gabriel porque não fazia o mínimo sentido deixá-lo ali. Rasguei-o, não com mágoa, não com raiva, não por vingança. Rasguei porque ali não era mais lugar pro Gabriel ficar. Porque ele já cumprira o seu papel na minha vida e eu sei que virão outros como ele, para me instruir sobre tantas outras dores e alegrias. Fechei a gaveta e apaguei a luz como se nada tivesse acontecido. O Gabriel não voltaria mais.

f. 

24 de fev. de 2012

Assuntos inacabados



O que de você está em mim, pulsa em mim com cada batida do coração. Escorre esse sentimento por cada veia, vaza esse desejo em cada poro. Porque tudo é você. O personagem da novela que tem o seu nome, a notícia no jornal sobre a sua cidade, sua banda favorita que eu aprendi a adorar, o imperativo que de tanto você repetir passei a usar. E até quem sabe que o “nós” existiu entre a gente, sem querer, inventa maneiras de te trazer a tona. Só isso basta para me aborrecer. Por que sempre que eu estou fechando a porta você coloca o pé para entrar? Nós tivemos uma história curta daquelas que se lembra pro resto da vida, mas estar com você era tão solitário, às vezes. E chegou um momento, eu estava mesmo vivendo tudo sozinha. Bem, não havia outra escolha senão me dar a preferência. E ainda esperei você mudar de idéia, uma vez que a prioridade era toda sua. Até hoje me pergunto o porquê de não te deixar morrer em mim. É algo que está preso nas minhas necessidades e extrapola a minha força de vontade. Certamente, você se transformou em um desses assuntos inacabados do qual só o esgotamento natural me faria sentir completa. Então, quem sabe mais tarde você resolve me levar a sério e reaver a melhor parte de mim. Ou não. Não vou me descabelar porque você não me quer, mas estou pensando desesperadamente em me abandonar por uns tempos. Pelo menos, até você passar.

f.

13 de fev. de 2012

Sobre algumas partidas



A gente nunca imaginaria que aquela seria a última vez que nos veríamos. E como seria possível? Não é pra compreender. A vida acontece e ponto. Sua antagonista, também. Pode correr em ciclo, ou pode seguir em linha reta (você elege a opção que te convém acreditar). A verdade é que ninguém ta preparado, a gente nota ao chorar pelas pessoas que menos se espera. Simples demais. Triste demais.
A gente não viveu muitas coisas e não disse muitas coisas um ao outro. Mas eu me lembro de algumas micaretas, copas e réveillons, e sei que você levava o sorriso para onde quer que fosse e o dividia sem quaisquer restrições.
Outro dia o vizinho da frente também foi embora, por escolha própria, sabe. É claro que sabe. Mas, fico pensando, se tivesse como, você teria ficado? É que ta feio demais por aqui, não é? Todo mundo deixando todo mundo. Mas as pessoas ainda valem a pena no meio desse caos.
O que passa rápido de mais, de repente, ganha uma importância gritante, e a gente nota o quanto o tempo é insuficiente. Se a gente deixa de ser egoísta, fica mais fácil aceitar as decisões do destino. Só que sempre fica aquela pedrinha incomodando, afinal não haverá mais encontros ao acaso ou acenos de até breve. A partir de agora tudo vai estar um pouco diferente. Então não adianta mais olhar pro lado e esperar você aparecer na calçada, sempre vestido de alegria, certo?
É. Ainda tô assimilando esses últimos acontecimentos e juro que não vou te julgar por ter se afastado. É que ver as pessoas indo embora desse jeito, irreversível, é estranho e é assustador. Porque chegará um dia, eu vou acordar e perceber que já não recordo tão bem do som da sua voz ou das suas expressões. Mas ninguém tem noção da falta que o outro pode fazer. Até fazer. E faz.


f.

10 de fev. de 2012

Supera


Ai, menina, você está assim há tempo demais. Já é hora de variar, ordenar aquela faxina e se livrar de tudo o que não presta. Você sabe que não vai fazer nada sozinha. Levanta daí e toma uma iniciativa. Escolhe a vida, menina! Enquanto ela ainda torce por você. Usa essa tua coragem recolhida, essa força mofada. Procrastinar as razões não vai te levar a nenhum lugar. Experimenta se desfazer dessa dor, você não precisa mais disso. Esvazia do armário todos esses sentimentos pobres, são roupas velhas que você não vai mais usar. Pratica o desapego que o contrário disso enlouquece. Abnega qualquer culpa, supera a amargura. Destruição também é mudança. E olha pra frente, menina. É pra lá que a vida te chama. E é pra lá que você tem de ir.

f.

9 de fev. de 2012

Uma fé infinita...

Isso que se esvai, que não acontece, que brinca de se esconder, que se confunde, que se desperdiça, que não se entende, que não se vê, que não se acha, que se faz de difícil, que dói na gente, que faz joguinhos, que mente, que não olha nos olhos, que se cala, que se fecha, que aprisiona, que não anda junto, que muda de idéia, que joga na cara, que não se compromete, que conta vantagem, que não sente a falta, que não perdoa, que não enobrece, não pode ser amor, Meu Deus. Não é!

f.

Ânsia


"E quero brincar de esconde-esconde e dar minhas roupas para você e dizer que eu gosto dos seus sapatos e sentar nos degraus enquanto você toma banho e massagear seu pescoço e beijar seus pés e segurar a sua mão e sair para jantar e não me importar quando você comer minha comida e encontrar você no Rudy e falar sobre o dia e digitar suas cartas e carregar suas caixas e rir da sua paranóia e te dar fitas que você não vai ouvir e assistir a belos filmes e assistir a filmes horríveis e reclamar do rádio e tirar fotos de você quando você estiver dormindo e levantar para te levar o café e pãezinhos e geléia e ir ao Florent e tomar café à meia-noite e deixar você roubar meus cigarros e nunca achar os fósforos e contar pra você sobre o programa de TV que eu vi na noite passada e te levar ao oculista e não rir das suas piadas e querer você de manhã mas deixar você dormir mais um pouco e beijar suas costas e acariciar sua pele e dizer quanto eu amo seu cabelo seus olhos seus lábios seu pescoço seus peitos sua bunda sua

e sentar nos degraus e fumar até seu vizinho chegar em casa e sentar nos degraus e fumar até você chegar em casa e me preocupar quando você estiver atrasada e me surpreender quando você chegar mais cedo e te dar girassóis e ir à sua festa e dançar até não poder mais e me desculpar quando eu estiver errado e ficar feliz quando você me perdoar e olhar suas fotos e querer ter te conhecido desde que você nasceu e ouvir sua voz no meu ouvido e sentir sua pele na minha pele e ficar assustado quando você estiver zangada e um de seus olhos ficar vermelho e o outro azul e seu cabelo cair para a esquerda e seu rosto parecer oriental e dizer para você que você é linda e te abraçar quando você estiver ansiosa e segurar você quando você se machucar e querer você toda vez que eu te cheirar e te ofender quando te tocar e choramingar quando estiver do seu lado e choramingar quando não estiver e babar nos seus seios e cobrir você de noite e sentir frio quando você tirar meu cobertor e calor quando você não tirar e me derreter quando você sorrir e me acabar por completo quando você gargalhar e não entender por que você acha que estou te rejeitando quando eu não estou te rejeitando e pensar como você pôde achar que alguma vez te rejeitei e pensar em quem você é e te aceitar de qualquer jeito e te falar sobre o garoto da floresta encantada que atravessou o oceano porque te amava e escrever poemas para você e pensar por que você não acredita em mim e sentir tão profundamente que eu não ache palavras pra expressar esse sentimento e querer te comprar um gatinho do qual eu teria ciúmes porque ele teria mais atenção do que eu e deixar você ficar na cama quando você tiver que ir e chorar como um bebê quando você finalmente for e me livrar das pontas e te comprar presentes que você não queira e levá-los de volta e pedir para você casar comigo e ouvir você dizer não mais uma vez mas continuar pedindo porque apesar de você achar que eu não estava falando sério eu sempre falei sério desde a primeira vez que te pedi em casamento e vagar pela cidade achando que ela está vazia sem você e querer o que você quer e achar que estou me perdendo mas saber que estou seguro quando estou com você e te contar o que eu tenho de pior e tentar te dar o que eu tenho de melhor porque você não merece nada menos do que isso e responder suas perguntas quando eu preferir não responder e dizer a você a verdade mesmo quando eu realmente não queira e tentar ser honesto porque eu sei que você prefere assim e achar que está tudo acabado mas agüentar por mais dez minutos antes de você me jogar fora de sua vida e esquecer quem eu sou e tentar ficar mais próximo de você porque é lindo aprender a te conhecer e vale a pena o esforço e falar mal alemão com você e falar hebraico pior ainda e fazer amor com você às três da manhã e de alguma forma de alguma forma de alguma forma expressar um pouco deste esmagador embaraçoso interminável excessivo insuportável incondicional envolvente enriquecedor-de-coração ampliador-de-mente progressivo infindável amor que eu sinto por você."

[Trecho da peça "Crave",  de 1998]
Sarah Kane

2 de jan. de 2012

Doce-amargo


Logo você vai notar as palavras mornas, a mão solta e o corpo alheio. E mais depressa ainda vai lembrar-se dos pequenos desatinos e dos ternos segredos confessados dentro do quarto que agora permanece de portas e janelas escancaradas e interior vazio. E vai perceber também o coração inóspito, a voz soturna e a pele arrefecida pelo distanciamento. E vai querer entender esse caminho tão contra-intuitivo que se projetou a sua frente e passou a ser o seu chão. Você vai trazer à tona
as músicas,
a meia luz,
os pés embaralhados,
os bilhetes,
os suspiros,
a saudade,
a urgência,
o calor,
as provocações,
as palavras bonitas,
o sossego,
a certeza,
 a felicidade.
Você vai cobrar respostas, carinhos e promessas. E vai estar confuso diante da omissão dessa garganta convenientemente rouca quando indagada sobre o paradeiro daquele sentimento onde se costumava morar. É que ela quase não recorda esses suaves retratos envelhecidos, desbotados e só pode acusar a vida, o acaso, o tempo...
Sei lá.
Estou tão perdida quanto você.

f.

1 de jan. de 2012

Poemeto do não-amor


Por que não
Ir na contra-mão
Calar o refrão
Perder a razão
Trocar a direção
Tentar a exceção
Preferir a paixão

E afastar a solidão
?

f.

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