Quando eu conheci o Gabriel, ele
estava em outra e eu também. Mas éramos colegas de classe, então passamos a nos
ver todos os dias. O Gabriel sempre chamou a atenção com o seu estilo despojado
e um humor inteligente. Ele parecia falar com todo mundo, menos comigo.
Um dia eu estava na biblioteca com
umas amigas pesquisando para um trabalho em grupo e o Gabriel apareceu. Ele
ficou com sua equipe numa mesa próxima, e ao final das atividades a gente já tinha
se juntado pra bagunçar baixinho. O Gabriel sentou ao meu lado. E nós
conversamos pela primeira vez. Isso não mudou muita coisa entre nós. Agora a
gente se cruzava nos corredores e se cumprimentava. A essa altura eu já estava
na do Gabriel, mesmo que ele ainda estivesse em outra.
Semanas depois, nos encontramos
em uma festa. Falamos-nos brevemente e depois disso não o vi mais. No dia seguinte,
me disseram que ele passou um bom tempo me procurando na festa. Meu estômago começou a
soltar fogos de artifício.
Arquitetei um plano para me
encontrar com o Gabriel sem que ele soubesse do meu interesse. O plano deu
certo e fomos ao cinema. Foi lá então o nosso primeiro beijo. O beijo mais doce
que eu já recebera. A partir daí, não nos desgrudamos mais.
No 12 de junho, o Gabriel me
pediu em namoro. E eu soltei um não bem no meio da cara dele. O Gabriel queria
namorar e eu não sabia o que queria. Ele pagou a conta e pediu um táxi para
mim. Voltei para casa chorando e sozinha, mas pro Gabriel foi pior. No dia
seguinte, conversamos sobre o ocorrido e concordamos em não rotular a nossa
relação. Com o passar do tempo, eu percebi o quanto o Gabriel era especial. E logo
desejei ser a sua namorada. O segundo pedido de namoro foi feito por mim.
O Gabriel me olhou sem entender e
começou a rir da minha cara. Nós estávamos oficialmente namorando. Ele cuidava
de mim e me fazia crer em todas as bobagens piegas dos namorados. Nós saíamos
pelas ruas sem destino, trocando pedaços das nossas vidas e sendo felizes por
estarmos juntos. No meu aniversário, o Gabriel me mandou flores e me levou para
jantar. Ele conquistou o apreço do meu pai e virou o novo filho da minha mãe. E
eu comecei a achar que não podia mais viver sem o Gabriel.
Nós vivemos sonhos por um bom
tempo. Até que o Gabriel mudou de personalidade. Ele não quis conversar, nem me
explicar o que estava acontecendo. E eu tive que ser paciente e dar espaço para
ele. No final, o Gabriel não queria mesmo continuar comigo, e nos separamos. Entrei
em estado letárgico. E quem costumava afirmar com convicção, no início, que não
combinávamos, se surpreendeu ao saber que não éramos mais casal.
Passei pelas mais melosas canções
de amor até chegar à página do Gabriel na internet. Ele dizia estar à procura
de alguém para amar. Esse alguém não era eu. Em uma segunda visita, o Gabriel
já havia encontrado. Então, tudo fez sentido. Ele me enganara, havia olhado nos
meus olhos e mentido sobre suas razões.
O pior era ter que conviver com o
Gabriel, por causa das aulas. Eu passei então a ser torturada diariamente. O Gabriel
havia se tornado o meu melhor amigo, o meu melhor namorado, e agora nós agíamos
como dois estranhos. O pior de ter o Gabriel foi ter que perdê-lo depois. E com
todas as coisas que ele me fez, eu ainda gostava dele.
Passei um tempo amando e odiando
o Gabriel simultaneamente. Aprendi um monte de coisa que ele nem imagina que me
ensinou. O Gabriel me deixou vulnerável por um tempo, mas tudo que ele causou
me fez forte. Eu descobri pessoas que se importam comigo de verdade. Aprendi a
sorrir em plena guerra e a sair vitoriosa. Passei a exercitar a cautela para
não mergulhar de cabeça no chão. E entendi mais sobre a dialética de liberdade
e sobre a vida. O Gabriel foi um grande professor e quando percebi isso passei
a lembrar dele, não por sua traição e desonestidade, mas por gostar de poesia e
não sentir a necessidade de rir quando os outros riam.
Hoje o Gabriel me apareceu de
dentro de uma gaveta, selado em uma caixa que eu nem tinha lembrança de ter
mantido. Eu rasguei o Gabriel porque não fazia o mínimo sentido deixá-lo ali.
Rasguei-o, não com mágoa, não com raiva, não por vingança. Rasguei porque ali
não era mais lugar pro Gabriel ficar. Porque ele já cumprira o seu papel na
minha vida e eu sei que virão outros como ele, para me instruir sobre tantas
outras dores e alegrias. Fechei a gaveta e apaguei a luz como se nada tivesse
acontecido. O Gabriel não voltaria mais.
f.
Bem assim a minha história.
ResponderExcluirAcabou porque tinha que acabar.
Beijo.
Pois é, Laís. Certas coisas só são compreendidas depois que passam... Agradeço a visita!
ExcluirbjO