’Cause all
of me
Loves all of
you
-John Legend
Nossas mãos brincando entre si, preguiçosas. É tudo ao que assisto nessa
entorpecente tarde, enquanto, vagarosamente, desenho um sorrisinho, daqueles que
a cada minuto se dá conta de toda magia invisível. O colchão é um lar que
recebe da vidraça as frestas da luz que entra. O mundo lá fora é só mais um
planeta avulso que não faz ideia do amor que aflora entre quatro paredes e o
infinito. E debaixo da nossa janela ensolarada, uma ternura incontável pela
vida que ainda vai acontecer. Ele me promete sorvete de leite condensado, faz
mais ou menos uma hora. Mas ele não vai. Nem eu insisto. A geladeira parece tão
além do que se consegue esperar, que seria perda de tempo tentar. Está tudo tão
quieto e eu adoro fazer esse nada com ele. É nessa maré que me dou conta do
quanto já conheço cada dobrinha, cada ruga e formato dos seus dedos. E não tem
volta. O tempo nem parece andar e eu só posso pedir para que cada segundo se
alargue na sensação de horas. Está tudo tão fora da realidade agora que se
fosse acaso eu até tenho certeza de que me apaixonaria de novo uma centena de
vezes mais. É tanta intensidade e querência! Desejo seus beijos mais que água. Só
que olho pro lado e ele quase dorme. Paraliso. Eu queria, queria fazê-lo compreender sem profusão de verbo que o espaço que ele ocupa é bem maior do que o que, normalmente,
proponho. São dele os arrepios e as promessas de mindinho. O plano A e o plano B.
Os filhos com o nome dos nossos ídolos e os passeios mais memoráveis pelas
esquinas do mundo. Eu queria fazê-lo perceber o chão tremendo quando o meu
coração pula acelerado, ainda, depois de tanto tempo, pelo menor indício de
elogio e admiração. Quando ninguém mais consegue alcançar o que atravessa meus
pensamentos esquisitos, eu sei que posso confiar a ele os esconderijos, os
alarmes e os amanhãs. Que afora dores e partidas, hoje escrevo muito mais sobre
os abraços. Que ele me fez renascer para a vida que eu havia enterrado numa
rotina maçante e cômoda, sem fazer cálculo de toda a perda. Eu sou ele um pouco
mais que a mim mesma, em boa parte dos dias, embora isso seja mais censurável
que poético. E whatever! Entre
mudanças de opinião e alguns pontos de vista, ele continua sendo meu reflexo e
nossas falhas tão cúmplices quanto sempre. Ah, eu queria fazê-lo entender que
nenhum presente de aniversário, natal ou dia dos namorados vai me improvisar sentimento melhor do que o que chega com suas intenções de carinho. E é tão bom sentir
que nós nos completamos. Não que isso sugira alguma falta, mas juntos, ficamos
mais bonitos. E somos mais fortes. E encontramos mais coragem. E nossa coleção
de música e livros cresce. E as segundas-feiras se tornam mais fáceis. E a vida
vale um pouco mais a pena. Às vezes, eu só desejo me fundir nos seus braços-de-casa
e morar lá até o fim. Mas as únicas palavras que solto são que o amo. Mesmo
querendo despejar todas essas outras urgências, eu só consigo articular o
tantão do básico: eu-te-amo. De olhos cerrados, ele só abre um daqueles sorrisos cínicos. De alguma
forma ele sabe.
f.